Bolsista: MARIA EDUARDA CORREIA SYKORA
Orientador(a): VERONICA SCHMITZ PEREIRA
Resumo: A hanseníase continua sendo a principal causa infecciosa de incapacidades físicas no mundo, com a neuropatia periférica desempenhando papel central na sua patogênese. Os episódios reacionais, manifestações inflamatórias agudas que afetam principalmente a pele e os nervos, representam a principal causa de morbidade e progressão para incapacidades, ocorrendo em aproximadamente 50% dos pacientes. Estes episódios podem surgir em qualquer momento do curso da doença: antes, durante ou após o tratamento, e sua abordagem terapêutica é complexa, exigindo frequentemente o uso prolongado de corticosteroides, com riscos associados de efeitos adversos.Os episódios reacionais são classificados em dois tipos: a reação reversa (RR, ou tipo 1), mais comum nas formas borderline (BT, BB, BL), e o eritema nodoso hansênico (ENH, ou tipo 2), característico dos pacientes multibacilares (BL, LL). Embora a imunidade adaptativa tenha sido historicamente considerada a principal via envolvida, estudos recentes destacam a importância dos mecanismos da imunidade inata, especialmente a regulação da autofagia e a ativação de inflamassomas, na determinação das formas clínicas da hanseníase e na gênese dos episódios reacionais.Achados de nosso grupo demonstraram que Mycobacterium leprae é capaz de inibir a autofagia em células de lesão de pele de pacientes lepromatosos. Além disso, em pacientes que desenvolveram RR, foi identificado bloqueio na expressão de genes associados à via autofágica. A disfunção da autofagia pode promover a ativação exacerbada de inflamassomas, contribuindo para o aumento da resposta inflamatória. Embora o papel dos inflamassomas na hanseníase ainda seja pouco compreendido, evidências crescentes sugerem que sua ativação desregulada pode estar diretamente relacionada à ocorrência e gravidade dos episódios reacionais.Um aspecto inovador e emergente dessa linha de investigação é a influência da dieta na modulação das vias de autofagia e inflamassoma. Estudos em outras doenças inflamatórias indicam que fatores dietéticos como restrição calórica, composição lipídica, disponibilidade de aminoácidos e micronutrientes podem modular diretamente os níveis de autofagia celular e a ativação de inflamassomas. No contexto da hanseníase, essa relação permanece pouco explorada, mas levanta a hipótese de que componentes da dieta possam atuar como gatilhos ou moduladores da susceptibilidade aos episódios reacionais, particularmente em indivíduos predispostos.Neste sentido, o presente estudo justifica-se pela necessidade de investigar, de forma integrada, a regulação das vias de autofagia e inflamassoma na hanseníase, com foco especial na influência da dieta sobre esses processos celulares. A elucidação desses mecanismos poderá permitir a identificação de biomarcadores clínicos e moleculares capazes de prever o risco de reações hansênicas já no momento do diagnóstico, permitindo intervenções precoces e monitoramento mais rigoroso dos pacientes com maior risco de desenvolver reações.Adicionalmente, essa abordagem poderá abrir novas perspectivas terapêuticas e profiláticas, baseadas na modulação nutricional de vias inflamatórias, visando não apenas o controle das reações, mas também a prevenção de lesões neurais e incapacidades permanentes. A investigação do eixo dietaautofagiainflamassoma na hanseníase representa, portanto, um aspecto promissor para o avanço no manejo clínico e na compreensão da fisiopatologia da doença.